Por que as duas Coreias seguem tecnicamenteblaze pt brguerra, 70 anos após acordoblaze pt brcessar-fogo:blaze pt br

homem sendo abordado por outro, que usa roupasblaze pt brsoldado e aponta uma arma

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, A inimizade e a desconfiança marcaram as relações entre os governos do Norte e do Sul desde a Guerra da Coreia, entre 1950 e 1953
A zona desmilitarizada é o único local onde soldados das duas Coreias se encontram frente a frente.

Crédito, Huw Evans Picture Agency

Legenda da foto, A zona desmilitarizada é o único local onde soldados das duas Coreias se encontram frente a frente

Em 27blaze pt brjulhoblaze pt br2023, comemora-se o 70º aniversário do cessar-fogo. Mas ele foi idealizado como um acordo provisório, até que fosse assinado o tratadoblaze pt brpaz definitivo.

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Por que o tratadoblaze pt brpaz nunca foi assinado? E como as duas Coreias viveram até hojeblaze pt brum estadoblaze pt brguerra técnico permanente?

A Guerra da Coreia

Desde o início do século 20 e ao longo da Segunda Guerra Mundial, a Coreia permaneceu sob o domínio colonial do Japão.

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Após a derrota japonesablaze pt br1945, a União Soviética ocupou a metade da península coreana, ao norte do paralelo 38, enquanto os Estados Unidos ficaram com a metade sul.

A ideia era que o povo coreano decidisse seu próprio futuro nos anos seguintes, mas nunca se chegou a um acordo para designar o sistema político e um governo unificado para toda a península.

Pelo contrário, as diferenças políticas e ideológicas aprofundaram-se entre o Norte – que criou reformas comunistasblaze pt brgrande escala – e o Sul – que conservou o sistema capitalista, com um governo aliado aos Estados Unidos. O resultado foi a criaçãoblaze pt brdois Estados independentes.

Assim,blaze pt brPyongyang, o líder norte-coreano Kim Il-Sung (1912-1994) – avô do líder atual, Kim Jong-un – assumiu o poder absoluto da República Popular Democrática da Coreia (o nome oficial da Coreia do Norte). E,blaze pt brSeul, Syngman Rhee (1875-1965) tornou-se o primeiro presidente da República da Coreia, a Coreia do Sul.

No dia 25blaze pt brjunhoblaze pt br1950, a Coreia do Norte invadiu o sul com apoio político e logístico da União Soviética e da China. A intenção era reunificar o país, estabelecendo um único regime comunistablaze pt brtoda a península.

Nos primeiros meses, a Coreia do Norte chegou muito pertoblaze pt brconseguir o seu intento. Em setembroblaze pt br1950, ela havia conquistado quase toda a península, exceto pela cidade portuáriablaze pt brBusan, no sudeste do país, e seus arredores.

A Coreia do Sul, com o apoio dos Estados Unidos, seus aliados e amparada pela ONU, resistiu à invasão e lançou um contra-ataqueblaze pt brmassa.

A República da Coreia conseguiu então ocupar quase toda a península, relegando a Coreia do Norte a duas regiões na fronteira norte com a China.

barco militar na água - fotoblaze pt brpreto e branco

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Legenda da foto, O desembarqueblaze pt brIncheon – a oeste da capital sul-coreana, Seul

Mas a entrada da China no conflito foi decisiva. Estimativas indicam que os chineses, liderados por Mao Tsé-Tung, enviaram 1 a 3 milhõesblaze pt brsoldados para a Coreia, equilibrando o conflito e deslocando a linhablaze pt brfrenteblaze pt brvolta para o sul.

Com isso, a fronteira foi se estabilizando aos poucosblaze pt brvolta do paralelo 38 na primeira metadeblaze pt br1951.

Em julho daquele ano, a guerra chegou a um impasse que obrigou as partes a iniciar conversasblaze pt brpaz, na cidade fronteiriçablaze pt brKaesong, na Coreia do Norte. Mas o cessar-fogo ainda estava distante, pois os dois lados mantinham diferenças inegociáveis.

De um lado, a China e a União Soviética insistiamblaze pt brtraçar a fronteira no paralelo 38.

Já os Estados Unidos e seus aliados propunhamblaze pt brfixação na linhablaze pt brfrente do conflito – que, naquele momento, estava a dezenasblaze pt brquilômetros mais ao norte.

Por outro lado, os comunistas exigiam a repatriação obrigatóriablaze pt brtodos os prisioneirosblaze pt brguerra, enquanto seus rivais propunham que cada prisioneiro escolhesse voluntariamente se preferia instalar-se na Coreia do Norte ou do Sul.

Estas e outras questões, aliadas à desconfiança mútua e acusaçõesblaze pt brmaus tratosblaze pt brprisioneiros das duas partes, suspenderam as negociações entre agostoblaze pt br1951 e abrilblaze pt br1952.

Os diálogos recomeçariamblaze pt brum novo local: a aldeiablaze pt brPanmunjom, que, até hoje, segue sendo a principal sedeblaze pt brnegociações na zona desmilitarizada.

Com a guerra suspensablaze pt br1953, a posse do novo presidente americano, Dwight D. Eisenhowerblaze pt brjaneiro daquele ano e a morte do líder soviético Josef Stalinblaze pt brmarço, a buscablaze pt bruma solução foi acelerada. E,blaze pt br27blaze pt brjulhoblaze pt br1953, foi assinado o cessar-fogoblaze pt brPanmunjom.

O fundador da Coreia do Norte, Kim Il-Sung, foi um dos seis signatários do cessar-fogoblaze pt br1953, ao lado dos representantes do exército norte-coreano, do Comando das Nações Unidas e da China.s Unidos reverter o curso da guerra.

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Legenda da foto, O fundador da Coreia do Norte, Kim Il-Sung (esq.), foi um dos seis signatários do cessar-fogo

O armistício

O histórico cessar-fogo suspendeu a Guerra da Coreia com um "empate técnico" entre o Norte e o Sul e um total estimadoblaze pt br4 a 6 milhõesblaze pt brmortos, entre civis e militares.

A Coreia do Norte e a China,blaze pt brum lado, e os Estados Unidos, representando o Comando das Nações Unidas, assinaram o documento.

A Coreia do Sul foi a grande ausente, já que o presidente Rhee se opunha às conversaçõesblaze pt brpaz, defendendo a vitória total do Sul – o que, na época, era inconcebível.

Alémblaze pt brsuspender as hostilidades, o acordoblaze pt brPanmunjom estabeleceu uma zona desmilitarizada ao longo do paralelo 38, que serviriablaze pt brproteção contra possíveis enfrentamentos entre as duas Coreias.

O armistício também determinou a retiradablaze pt brtodas as forças, suprimentos e equipamentos militares da zona desmilitarizada e suas áreas fronteiriças, proibindo a introduçãoblaze pt brnovos armamentos e soldados na península. Uma comissão internacional neutra foi designada para garantir o cumprimento do acordo.

Mas o armistícioblaze pt br1953 foi criado como solução temporária até que as partes chegassem a um acordoblaze pt brpaz formal, o que não aconteceu. Por isso, vários problemas ficaram sem solução.

Por que não houve acordoblaze pt brpaz?

caminhão cruzando a fronteira

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Legenda da foto, A fronteira entre as duas Coreias, no paralelo 38, é uma divisão política e econômica

Em primeiro lugar, o cessar-fogo não reconheceu as duas Coreias como Estados soberanos separados. Por isso, os dois lados continuam reivindicando até hoje, nas suas Constituições, todo o território da península comoblaze pt brjurisdição.

O acordo também não abordou as disputas territoriais, o que gerou choques e tensões, especialmente nas problemáticas águasblaze pt brfronteira no Mar Amarelo. E o armistício também não incluiu as disposições necessárias para a elaboração do tratadoblaze pt brpaz definitivo no futuro.

Por isso, foi preciso prorrogar o cessar-fogo nos primeiros anos, que foram marcados pelo apogeu da Guerra Fria. Os dois lados se consideravam inimigos irreconciliáveis, sem nenhuma intençãoblaze pt brprocurar formasblaze pt brpromoção da paz.

Todos esses motivos fizeram com que as intensas diferenças políticas e ideológicas e a desconfiança mútua entre as duas Coreias impedissem, ao longo do tempo, a substituição do acordoblaze pt brcessar-fogo por um tratadoblaze pt brpaz definitivo.

Outro fator importante foi o fatoblaze pt brque as duas principais potências estrangeiras envolvidas no conflito – os Estados Unidos e a China – nunca demonstraram disposição para promover um tratadoblaze pt brpaz entre as Coreias, por motivos estratégicos eblaze pt brsegurança.

Atualmente, os Estados Unidos mantêm maisblaze pt br28 mil soldados na Coreia do Sul. Este contingente é fundamental para dissuadir a Coreia do Norte e, acimablaze pt brtudo, para garantir a presença militar americana na Ásia oriental, frente a potências rivais como a China e a Rússia.

Se for assinado, o tratadoblaze pt brpaz definitivo poderá causar a retirada ou a redução das tropas americanas, o que faria com que os Estados Unidos perdessem poder na região.

Os exércitos da Coreia do Sul e dos Estados Unidos realizam manobras militares conjuntas com frequência.

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Legenda da foto, Númeroblaze pt brsoldados americanos na Coreia do Sul chega a quase 30 mil

Por outro lado, a China sempre observou com receio qualquer mudança da situação atual da península.

Como a Coreia do Sul tem o dobro da população eblaze pt breconomia é 50 vezes maior que a da Coreia do Norte, o acordoblaze pt brpaz poderia ser o primeiro passo para a reunificação do país sob o comandoblaze pt brSeul, ampliando o territórioblaze pt brum importante aliado militar dos Estados Unidos até a fronteira com a China.

Por fim, o armistício permanece vigente pelo simples fatoblaze pt brque,blaze pt brcerta forma, ele funcionou. Apesar da profunda inimizade declarada pelas duas Coreias por décadas, a península não mergulhou na guerra novamente.

Mas já foram verificados, ao longo dos 70 anosblaze pt brcessar-fogo, incidentesblaze pt brmaior ou menor gravidade, que chamaram a atenção para a fragilidade do estado técnicoblaze pt brguerra entre as Coreias do Norte e do Sul.

Tensões, assassinatos e bombardeio

A primeira violação grave do acordoblaze pt br1953 ocorreu cinco anos após ablaze pt brassinatura.

Os Estados Unidos instalaram armas nucleares na Coreia do Sul como recurso estratégico contra a União Soviética, que faz fronteira com a Coreia do Norte, no nordeste da península.

Na época, Pyongyang denunciou veementemente a violação do armistício. Mas, paradoxalmente, a Coreia do Norte possui hoje seu próprio arsenalblaze pt brarmas nucleares, enquanto as armas atômicas do Sul foram retiradas do paísblaze pt br1991, pelo então presidente americano George H. W. Bush.

Já na zona desmilitarizada, os primeiros incidentes significativos ocorreram na décadablaze pt br1970. Em agostoblaze pt br1976, soldados norte-coreanos assassinaram dois oficiais do exército americano que tentavam podar uma árvore junto à linhablaze pt brfronteira da região.

O incidente elevou a tensão entre os dois países, mas não teve maiores consequências.

Logoblaze pt brseguida, foram encontrados diversos túneis subterrâneos norte-coreanos na fronteira, possivelmente para uma invasão do sul. Esta descoberta fez subir as tensões e levou à península à beirablaze pt bruma nova guerra.

Na décadablaze pt br1990 e no início dos anos 2000, ocorreram três enfrentamentos navaisblaze pt bráguas limítrofes, com mortosblaze pt brambos os lados. Mas o ano mais tenso foi 2010, quando surgiram os incidentes mais graves.

Em novembroblaze pt br2010, o bombardeio da ilhablaze pt brYeonpyeong, na Coreia do Sul, causou a primeira trocablaze pt brartilharia entre as duas Coreias desde 1953, disparando o alarmeblaze pt brguerra iminente.

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Legenda da foto, Em novembroblaze pt br2010, o bombardeio da ilhablaze pt brYeonpyeong, na Coreia do Sul, causou a primeira trocablaze pt brartilharia entre as duas Coreias desde 1953

Em marçoblaze pt br2010, uma explosão afundou a corveta Cheonan, da marinha sul-coreana, causando a morteblaze pt br46 marinheiros. Seul atribuiu o incidente ao ataqueblaze pt brum torpedo da Coreia do Norte, que negoublaze pt brparticipação no incidente.

Seis meses depois,blaze pt br23blaze pt brnovembroblaze pt br2010, a Coreia do Norte bombardeou a ilha sul-coreanablaze pt brYeonpyeong, nas águas disputadas do Mar Amarelo. Quatro pessoas morreram naquele que foi o primeiro ataqueblaze pt brartilharia sobre território inimigo desde o cessar-fogo.

Seul respondeu com artilhariablaze pt brdireção ao Norte. Pela primeira vezblaze pt brdécadas, surgia a possibilidade da retomada efetiva do conflito, que felizmente se restringiu a estes incidentes isolados.

Por outro lado, Pyongyang realizou seis testes nucleares entre 2006 e 2017, reafirmando seu país como potência atômica. Em consequência, a Coreia do Norte sofreu fortes sanções internacionais, afastando ainda mais a possibilidadeblaze pt briniciar negociações para um tratadoblaze pt brpaz na península.

As tentativasblaze pt brestabelecer a paz

Entre todos os países envolvidos, a Coreia do Norte é a que demonstrou mais interesseblaze pt brassinar a paz definitiva ao longo dos últimos 70 anos.

O governo norte-coreano já propôs aos Estados Unidos,blaze pt brvárias ocasiões, a negociaçãoblaze pt brum acordoblaze pt brpaz. A resposta americana, na maioria dos casos, foi negativa ou inexistente.

É preciso terblaze pt brmente que a Coreia do Sul não assinou o cessar-fogoblaze pt br1953. Por isso, ela não tem autoridade para decidir, junto com Pyongyang e Washington, a substituição do acordo provisório por um tratadoblaze pt brpaz definitivo.

Depoisblaze pt brfrágeis tentativasblaze pt brnegociações nas décadasblaze pt br1990 e 2000, a chegada do presidente americano Donald Trump à Casa Brancablaze pt br2017 abriu inesperadamente uma porta que parecia estar fechada.

Donald Trump e Kim Jong-un

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Legenda da foto, Donald Trump e Kim Jong-un mantiveram um terceiro e breve encontro, na aldeiablaze pt brPanmunjom, na fronteira entre as duas Coreias.

Em uma primeira cúpulablaze pt brSingapura,blaze pt br2018, Trump e Kim Jong-un fizeram claros avanços para a normalização das relações bilaterais, o que fez com que o tratadoblaze pt brpaz se tornasse uma possibilidade real.

Mas o segundo encontro no ano seguinteblaze pt brHanói, no Vietnã, foi encerrado abruptamente sem que se chegasse a um acordo, eliminando as esperançasblaze pt brpôr um fim ao estadoblaze pt brguerra entre as duas Coreias.

O armistícioblaze pt br1953, concebido como uma solução provisória, consolidou-se como a garantia do status quo da península nas últimas sete décadas.

Esta situação anormal é considerada o mais claro exemplo ainda existente do legado geopolítico deixado pela Guerra Fria.

Um tratadoblaze pt brpaz formal poderia colocar fim à guerrablaze pt brtermos legais, mas o caminho para a verdadeira normalização das relações entre as Coreias do Norte e do Sul, separadas por uma imensa distância política ideológica e econômica, é um desafioblaze pt brproporções muito maiores.