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Como skate no Brasil foi da proibição às medalhas olímpícas:saque arbety
Crédito, Reuters
Como o skate no Brasil foisaque arbetyprática transgressora, perseguida por políticos conservadores, a esporte campeãosaque arbetymedalhas nas Olimpíadas?
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Fim do Matérias recomendadas
Conheça essa história e entenda os caminhos que levaram o Brasil a duas medalhas nos Jogos Olímpicossaque arbetyParis 2024 (veja mais informações ao fim desta reportagem).
Do 'surfinho' à conquista do espaço urbano
De origem californiana, a prática do skate chegou ao Brasil no final da décadasaque arbety1960 e se popularizou na segunda metade da década seguinte, relata o historiador Leonardo Brandão, professor da Universidade Regionalsaque arbetyBlumenau (Furb).
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"No início, os skatistas apenas deslizavam pelas ruas e calçadas imitando as manobras que os surfistas realizavam nas ondas do mar", escreve o pesquisador, acrescentando que, por conta disso, o skate era mais conhecido na época como "surfesaque arbetyasfalto" ou "surfinho".
A partirsaque arbety1977, no entanto, a atividade passa por um "processosaque arbetyesportivização", conta Brandão, com o desenvolvimentosaque arbetyum mercado, publicações especializadas, pistas, campeonatos, equipes, marcas e empresas interessadas nasaque arbetypromoção e profissionalização.
Até que, na décadasaque arbety1980, surge uma nova formasaque arbetypraticar o skate, que subvertia a lógica da atividade como prática esportiva: o street skate, ou skatesaque arbetyrua,saque arbetybom português.
"O street começa a perambular pelas cidades, principalmentesaque arbetypraças, onde existem bancos e corrimãos", diz Brandão,saque arbetyentrevista à BBC News Brasil.
"Ele traziasaque arbetynovidade um uso irreverente da cidade. Uma escada é planejada pelo urbanista para ser descida a pé e o corrimão para servirsaque arbetyapoio à mão. O skatista transgride, 'transvaloriza' esse uso", observa o pesquisador.
"A escada passa a ser um obstáculo que ele vai pularsaque arbetydiferentes maneiras, o corrimão, ele vai descer com o skate. Então o skatista faz um 'contra uso' da cidade e é isso que vai gerar conflitos"
Crédito, Reprodução
Da 'anarquia urbana' à proibição
O street skate se desenvolveu no Brasil misturado à cultura punk e com o mesmo espíritosaque arbetytransgressão e rebeldia.
"Eles [os skatistas] não se preocupam com a etiqueta social, nem com o sistema que tentam lhes impor. Criam uma anarquia urbana e circulam sem nenhum tiposaque arbetyautoritarismo. São os filhos do futuro! Não se importam com comentários ou críticas, pois banalidades já estão cansadossaque arbetyouvir. Eles pensam diferente do Status Quo e se comportam como tal."
O trecho ésaque arbetyautoriasaque arbetyPaulo Anshowinhas, editor da revista Yeah! e foi coletado pelo historiador Leonardo Brandão.
"Existe uma bifurcação no skate:saque arbetyum lado o skate praticadosaque arbetyrampas, associado à ideiasaque arbetyesporte e, posteriormente,saque arbetyesportes radicais", diz o professor da Furb.
"Agora, o skate na rua é considerado mais como uma espéciesaque arbetyuso da liberdade. Está mais perto do campo artístico, da criação, do que da competição, disciplina física e espaço instituído do esporte."
Na São Paulo da décadasaque arbety1980, os skatistassaque arbetyrua tinham nas marquises do Ibirapuera seu local preferido, devido ao chão liso e à proteção que a cobertura ofereciasaque arbetydias chuvosos.
O local porém tinha um vizinho careta: o prefeito Jânio Quadros, cujo gabinete estava instalado no Pavilhão Manoel da Nóbrega do parque, hoje sede do Museu Afro.
Vale lembrar que, antessaque arbetyser prefeitosaque arbetySão Paulo, Jânio Quadros foi por um brevíssimo período presidente do Brasil (de 31saque arbetyjaneiro a 25saque arbetyagostosaque arbety1961), tendo sido eleito sob o moralizante jingle anticorrupção "Varre, varre, vassourinha! Varre, varre a bandalheira!".
Pois,saque arbetyagostosaque arbety1986, o conservador Jânio Quadros dá as primeiras ordens para coibir a prática do skate no Ibirapuera, orientando a Polícia Militar a apreender os skates dos praticantes.
Após muitos atritos entre skatistas e policiais, a proibição efetiva é decretadasaque arbety19saque arbetymaiosaque arbety1988,saque arbetymemorando impresso no Diário Oficial.
Crédito, REPRODUÇÃO/ACERVO FOLHA DE S. PAULO
Inconformados com a proibição, os skatistas paulistanos organizaram uma manifestação, que reuniu cercasaque arbety200 participantes.
Eles foramsaque arbetyskate do metrô Paraíso ao parque do Ibirapuera, com a intençãosaque arbetyentregar "uma carta com maissaque arbety6 mil assinaturas" pedindo a reconsideração da proibição e a construçãosaque arbetyuma pista no local ousaque arbetyoutra área pública.
Quadros ordenou que os seguranças fechassem os portõessaque arbetyacesso ao parque e impedissem a entrada dos skatistas.
Alémsaque arbetynão receber os manifestantes, o então prefeito decidiu levar a proibição além, barrando o uso do skatesaque arbetytoda a cidadesaque arbetySão Paulo.
Brandão destaca que a proibição da capital paulista é a mais documentada, mas não foi a única do período.
Muitos municípios brasileiros proibiram o skate nas ruas no final da décadasaque arbety1980 e a repressão também aconteceusaque arbetycidades da Califórnia, nos Estados Unidos, berço do skate. Com a proibição, a repressão policial endureceu.
"Por duas vezes eu fui preso, me colocaram numa cela", conta o skatista Thronn,saque arbetyrelato colhido por Leonardo Brandão.
"Uma vez fui preso porque estava dando fiftys [deslizando com os eixos do skate] nos arcossaque arbetyferro da igrejasaque arbetyMoema. Uma vez no Parque do Ibirapuera, fui ao banheiro da lanchonete e, quando voltei, todos meus amigos tinham sido abordados e seus skates, confiscados", lembrou o skatista.
"Aí os guardas vieram querer pegar o meu, e o pessoal, já meio derrotado e cabisbaixo, pediu pra eu entregar também, mas comecei a lutar, girando como numa rodasaque arbetypunk e saiu voando caneta, blocossaque arbetyanotações, distintivos, moedas, tudo que os guardas tinham."
Crédito, REPRODUÇÃO/ACERVO FOLHA DE S. PAULO
Da prefeita que amava o skate às medalhassaque arbetyTóquio
No artigo acadêmico "De Jânio Quadros a Luiza Erundina: Uma história da proibição e do incentivo ao skate na cidadesaque arbetySão Paulo", Brandão lembra um caso saboroso, passado no fim do mandatosaque arbetyJânio Quadros, quando Luiza Erundina (PT) já havia sido eleita a nova prefeita.
Alexandre Ribeiro, um skatista conhecido da época, voltava com amigossaque arbetyuma apresentaçãosaque arbetycolegas americanos famosos,saque arbetyevento realizado no Ibirapuera.
O grupo cruzava a marquise do parquesaque arbetyseus skates, quando foi surpreendido por um guarda.
A turma brigava para tersaque arbetyvolta os skates apreendidos pelo homem da lei, quando chegou um "opalão preto" esaque arbetydentro saiu ele mesmo: o prefeito inimigo do skate.
"Jânio Quadros foi até nós e começou a perguntar: 'Que baderna é essa aqui? Vocês não sabem que eu proibi a práticasaque arbetyskate nas ruas da cidadesaque arbetySão Paulo, inclusive aqui no parque?", conta Ribeiro,saque arbetyrelato publicado no artigo acadêmico.
"Um dos meus amigos se desesperou e pegou o skate do meio da pilha, dizendo que a mãe dele iria dar uma bronca se ele perdesse o skate. Foi quando Jânio disse: 'Dê-me esse skate, ele foi apreendido' [...] Vixe, gelei após ouvir isso!", lembra Ribeiro, que posteriormente tornou-se professor da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), na áreasaque arbetyveterinária.
"Deram-se início às explicações, que estávamos apenassaque arbetypassagem [...]. Lembro-me que Jânio disse: [...] 'Ah, mas vocês são mesmo terríveis, devolvam-lhes os skates!! Escutem, aguardem o mandato da nova prefeita Erundina que irá libertar a prática do skate; inclusive liberará a volta dos camelôs às calçadas!'"
Crédito, REPRODUÇÃO/FACEBOOK/LUIZA ERUNDINA
Dito e feito. Mulher, nordestina, solteira e marxista, Erundina surpreendeu o próprio partido ao ser eleita prefeitasaque arbetySão Paulo e,saque arbetyumsaque arbetyseus primeiros atos, revogou a lei que proibia a práticasaque arbetyskate nas ruas da cidade.
A possesaque arbetyErundina foisaque arbety1ºsaque arbetyjaneirosaque arbety1989. No dia 8 daquele mês, numa matéria intitulada "Erundina começa a mostrar seu estilo", o jornal O Estadosaque arbetyS. Paulo registrava: "skates ao Parque do Ibirapuera e a volta dos vendedores ambulantes à praça da Sé foram as mudanças mais visíveis na cidadesaque arbetySão Paulo, durante a primeira semanasaque arbetymandato da prefeita Luiza Erundina".
O trecho também foi colhido por Brandão e consta do artigo já citado.
Em entrevista à Folha da Tarde, publicada na ediçãosaque arbety16saque arbetyjulhosaque arbety1990 sob o títulosaque arbety"Erundina: a prefeita que ama o skate", disse a então petista:
"Eu me sinto comprometida com os skatistas da cidade [...] Meu compromisso com eles é tão sério que ainda pretendo fazer partesaque arbetyalgum clube que reúna skatistas, embora já não tenha mais idade para fazer o mesmo que essa rapaziada maravilhosasaque arbetynossa cidade faz sobre um skate. Na nossa gestão vamos criar condições para que os adeptos deste esporte possam praticá-lo adequadamente."
A partir da gestãosaque arbetyErundina, o skate passou a ser menos marginalizado.
O processosaque arbetyreconhecimento social chegou a seu ápice com a estreia como esporte olímpico nos jogossaque arbetyTóquiosaque arbety2021.
Em 2015, o Brasil somava 8,4 milhõessaque arbetypraticantessaque arbetyskate, segundo pesquisa Datafolha, e a indústria nacional ligada ao esporte é considerada a segunda maior do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, cujo mercado é estimadosaque arbetyUS$ 4,5 bilhões (R$ 23,3 bilhões) ao ano.
A forte presença da atividade no país se refletiu no quadrosaque arbetymedalhas do Brasilsaque arbetyTóquio: Kelvin Hoefler ganhou a prata no street masculino, abrindo a contagemsaque arbetymedalhas do país naqueles Jogos Olímpicos.
Crédito, Reprodução/Twitter
A ex-prefeita Luiza Erundina cumprimentou Hoefler pelo feito no antigo Twitter e o atleta respondeu a ela: "Obrigado por acreditar no skate!"
No dia seguinte, foi a vez da maranhense Rayssa Leal fazer história, garantindo uma medalhasaque arbetyprata no street feminino e se tornando, aos 13 anos, a mais jovem desportista individual a ganhar uma medalhasaque arbetyOlimpíadas até então.
Crédito, Getty Images
"É muito louco. Saber que no início só minha mãe e meu pai me apoiavam e saíam com a cara e coragem para eu poder estar aqui", disse a vice-campeã olímpicasaque arbetyTóquio.
"Skate é, sim, para todo mundo, assim como qualquer esporte, como futebol e handebol. Muita gente fala que handebol é só para meninas. É para todos e skate não é só para meninos."
"O skate sempre foi visto como uma coisasaque arbetyhomem, e aí ela vai lá: uma menina,saque arbetyImperatriz do Maranhão no Nordeste, que começou a andarsaque arbetyskate vestidasaque arbetyfadinha e se torna uma campeã olímpicasaque arbetyTóquio", destaca Brandão, ele mesmo skatista desde os 12 anos.
"A gente não tem ideia ainda do que isso vai causar no sentidosaque arbetyliberar outras meninas para fazerem o que elas quiserem fazer da vida. O fatosaque arbetyela falar 'o skate é para todo mundo' carrega um teor político muito grande. Isso é mais uma etapa da conquista do espaço público pelas mulheres", considera o historiador.
"Durante muito tempo, as mulheres foram destinadas somente ao espaço privado. Mulher era para ficar dentrosaque arbetycasa e o homem no espaço público. Isso demonstra que as mulheres podem cada vez mais ir para o espaço público e fazer o que elas quiserem. Esse gesto político da Rayssa é mais importante até do que a medalha que ela ganhou."
Dois bronzes para o Brasilsaque arbetyParis 2024
Crédito, Reuters
Em Paris 2024, Rayssa Leal abriu o quadrosaque arbetymedalhas brasileiro, com a conquista do bronze na modalidade street aos 16 anos.
Com o bronze conquistado, ela se tornou a atleta mais jovem da história, entre homens e mulheres, a ir ao pódiosaque arbetyduas Olimpíadas.
Com uma equipesaque arbety12 skatistas, o Brasil ganhou ainda um segundo bronze com Augusto Akio, na modalidade park.
Reportagem publicada originalmentesaque arbetyjulhosaque arbety2021 e atualizada com informações sobre os Jogos Olímpicossaque arbetyParis 2024.
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