'Não é esmola, é reparação histórica': os quilombolas visitados por Lulatrello raven softwarecampanha que esperam demarcação há 18 anos:trello raven software

Crédito, Acervo Quilombo Arturos
Hoje, vivem naquela propriedade coletiva e no seu entorno 180 famílias,trello raven softwareum totaltrello raven software700 pessoas, com uma cultura e folclore próprios, herdadostrello raven softwareseus ancestraistrello raven softwareorigem africana, passando seus costumes, músicas, danças e ritostrello raven softwaregeraçãotrello raven softwaregeração.
Eles aguardam, há quase duas décadas, a regularização fundiária oficial — que os líderes argumentam que protegeria os quilombolas, por exemplo,trello raven softwareperder as terras para outros grupos e facilitaria aplicaçãotrello raven softwarepolíticas públicas no local.
A comunidade foi certificada como quilombola pela Fundação Cultural Palmarestrello raven software2004 — o primeiro passo no processotrello raven softwaretitulação.
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A etapa seguinte geralmente é ter um processo aberto no Incra (Instituto Nacionaltrello raven softwareColonização e Reforma Agrária), o principal órgão que gere esse processo, embora outros, como o Ministério Público Federal, possam estar envolvidos.
No Incra, os passos incluem a Elaboração do Relatório Técnicotrello raven softwareIdentificação e Delimitação (RTDI), publicação desse relatório, homologação pelo governo (reconhecimento do território como quilombola pelo poder federal), desapropriação (tirar outros grupos da terra quando necessário), e por fim, a chamada regularização fundiária.
Para os Arturos, o processo só começoutrello raven softwarefato no ano seguinte da certificação pela Fundação Cultural Palmares,trello raven software2005. Hoje, 18 anos mais tarde, é considerada a principal reivindicação da comunidade, e, segundo o Incra, não é possível saber quando e se esse processo será concluído.
O gestor da associação que administra o quilombo Arturos e um dos articuladores da campanha pela titulação, João Piotrello raven softwareSouza,trello raven software59 anos, cobrou agilidade do presidente.
“Estamos sofrendo especulação imobiliária e queremos nosso direitotrello raven softwarepreservar a sobrevivência e tradições — algumas delas que só existem aqui. Mas o processo é burocrático, o que é correto, mas poderia ser mais rápido. Dissemos isso ao Lula”, afirmou.
Defensores da regularizaçãotrello raven softwareterras apontam que ela é fundamental para a garantiatrello raven softwaredireitos às comunidades quilombolas já previstas na Constituição e que representam uma segurança para as comunidades.
Críticos das demarcações dizem que elas podem violar direito à propriedade privada ou ter um suposto impacto negativo no desenvolvimento econômico e disputas territoriais com outros grupos.

Crédito, Ricardo Stuckert/Presidência da República
1,3 milhãotrello raven softwarequilombolas no Brasil
A situação dos Arturos não é incomum. De acordo com o IBGE, existem atualmente 494 territórios quilombolas oficialmente delimitados e 4.859 comunidades foratrello raven softwareterras oficialmente delimitadas. Este número, quase dez vezes maior, estátrello raven softwarerevisão, a partirtrello raven softwaredados coletados recentemente.
Apesar desta contagem, uma dúvida persistia sobre essa população. Não havia até agora estimativas oficiaistrello raven softwarequantos quilombolas vivem no Brasil.
Isso mudou com a divulgação pelo IBGE nesta quinta-feira (27/8)trello raven softwareparte dos resultados iniciais do Censo 2022, o primeiro a contar os quilombolas na história do país.

Há maistrello raven software1,3 milhãotrello raven softwarepessoas autodeclaradas quilombolas no Brasil, segundo esses dados.
Quase novetrello raven softwarecada dez quilombolas (87,4%) vivemtrello raven softwareterritórios ainda não oficialmente titulados, como o quilombo Arturos, enquanto só 12,6% estãotrello raven softwareterritórios delimitados.

Marta Antunes, responsável pelo Projetotrello raven softwarePovos e Comunidades Tradicionais do IBGE, diz que os resultados do Censo superaram as expectativas dos pesquisadores. Eles antes baseavam seus conhecimentos apenastrello raven softwareregistros administrativos do Cadastro Único e os dadostrello raven softwarevacinação quilombola do DataSUS, explica Antunes.
As informações do IBGE mostram, por exemplo, que a região Nordeste concentra maistrello raven softwaredois terços desta população (veja mais detalhes abaixo).
Que ali estivesse boa parte dos quilombolas já era esperado pelos pesquisadores, porém o índicetrello raven softwaremaistrello raven software60% chamou atenção dos especialistas ouvidos pela reportagem.
Surpreendeu, ainda, a existênciatrello raven software55 municípios com maistrello raven software5 mil quilombolas e a presença delestrello raven software1.696 do totaltrello raven software5.568 municípios do país, diz Antunes.

Crédito, Getty Images
'Não é esmola, é reparação histórica'
Os Arturos compõem um grupo familiar que descendetrello raven softwareCamilo Silvério da Silva, que chegou ao Riotrello raven softwareJaneirotrello raven softwareum navio negreiro vindotrello raven softwareAngolatrello raven softwaremeados do século 19.
Logo após a chegada, Camilo foi enviado a Minas Gerais para trabalhar num povoado situado na Mata do Macuco, antigo municípiotrello raven softwareSanta Quitéria, hoje Esmeraldas. Lá, trabalhou nas minas e como tropeiro nas lavouras. Casou-se com a escrava alforriada Felismiba Rita Cândida, com quem teve seis filhos.
Entre os irmãos, Artur Camilo Silvério foi o que mais prosperou. Nasceutrello raven software1885, época da Lei do Ventre Livre, que determinou que os bebêstrello raven softwaremulheres escravizadas não teriam o mesmo destino que elas, e casou-se com Carmelinda Maria da Silva.
O casal teve 10 filhos e se estabeleceutrello raven softwareContagem, na localidade conhecida então conhecida como Domingos Pereira, onde adquiriram a propriedade na qual ainda vivem seus descendentes.
“Um pedaçotrello raven softwareterra, para boa parte do Brasil, é para gerar riqueza, para pôr no mercado. Para nós, é sobrevivência e cultura. A titulação não é um pedidotrello raven softwareesmola para o Estado — é nosso direito e uma reparação histórica por todos os anostrello raven softwareescravidão”, diz João Pio, que alémtrello raven softwarearticulador da comunidade, também é superintendentetrello raven softwarePolítica para a Promoção da Igualdade Racial da Prefeitura Municipaltrello raven softwareContagem.
O Incra disse à BBC News Brasil que o processotrello raven softwareregularização da Comunidade Quilombola dos Arturos estátrello raven softwarefasetrello raven softwareelaboração do Relatório Técnicotrello raven softwareIdentificação e Delimitação (RTID).
“Trata-se do levantamentotrello raven softwareinformações cartográficas, fundiárias, agronômicas, socioeconômicas, ambientais, históricas, etnográficas e antropológicas, que são obtidastrello raven softwarecampo, com a comunidade e com outras instituições públicas e privadas. O relatório tem como objetivo identificar os limitestrello raven softwarecada território.”
A autarquia afirmou, ainda, que não é possível definir o tempo médio para concluir processos desta natureza.
“A atividade é complexa, composta por várias etapas, e dependetrello raven softwareinformaçõestrello raven softwareterceiros — particulares e públicos”, dissetrello raven softwarenota, reiterando que o processotrello raven softwareidentificação e a regularização fundiária não é competência exclusiva do Incra, mas também envolve União, Distrito Federal, dos estados e dos municípios.

Crédito, Getty Images
Um processo 'tortuoso e longo'
A regularizaçãotrello raven softwareterras, avalia Milene Maia, coordenadora do Programatrello raven softwarePolítica e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA), é fundamental para a garantiatrello raven softwaredireitos às comunidades quilombolas já previstas na Constituição Federaltrello raven software1988.
“A titulação permite uma segurança das comunidadestrello raven softwarerelação à proteção e ao uso do seu território. Uma vez que o seu território não está oficialmente reconhecido, isso possibilita conflito com terceiros que disputam essa área.”
Outro fator importante, lembra João Pio, é que, com a titulação, a população passa a ter gerenciamento completo do seu território, podendo escolher, por exemplo, como deseja fazer o cultivo agrícola e como organizar as escolas dentro das comunidades.
O processo para conseguir a regularização das terras, no entanto, é caracterizado por Maia como “tortuoso e longo”.
“A revisão da instrução normativa é urgente, inclusive é uma demanda do movimento quilombola, para que o executivo possa,trello raven softwareespecial o Incra, revisar os passos e agilizar a parte burocrática. Temos maistrello raven software1.800 processos abertos no Incra que também não avançam, o que mostra como é gritante a morosidade do processotrello raven softwaretitulação.”
No governo anterior, o ex-presidente Jair Bolsonaro se posicionavatrello raven softwareforma abertamente contra a titulaçãotrello raven softwareterras quilombolas.
Meses antestrello raven softwareser eleito, Bolsonaro prometeu que não alocaria recursos financeiros à causa e se referiu a um integrante da comunidade com uma medidatrello raven softwarepeso usada para animais.
“Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Eles não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve (...) Pode ter certeza que, seu eu chegar lá, não vai ter dinheiro para ONG (…). Não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola”.
A promessa foi parcialmente levadatrello raven softwarefrente: seu governo emitiu apenas 12 títulostrello raven softwareterras quilombolas, a média histórica mais baixatrello raven software1995, segundo divulgou o Jornal da Cultura, com dados obtidos pela Leitrello raven softwareAcesso à Informação.
Até agora, com um semestre do novo governo Lula, foram contabilizadas três titulações parciais, 21 Portariastrello raven softwareDeclaração (um passo inicial no processo) e três Relatóriostrello raven softwareIdentificação e Delimitação (RTID)trello raven softwareTerras Quilombolas. É o que aponta o levantamento realizado pela Comissão Pró-Índiotrello raven softwareSão Paulo (CPI-SP).

Crédito, Getty Images
Concentração no Nordeste
Na avaliaçãotrello raven softwareFernando Damasco, gerentetrello raven softwareTerritórios Tradicionais e Áreas Protegidas do IBGE, o conhecimento sobre a diversidade territorial pode ajudar na criaçãotrello raven softwarepolíticas públicas que atendam as necessidades diversas das diferentes comunidades.
“Esse panorama certamente permitirá o aperfeiçoamento da atuação dos órgãos que executam políticas públicas destinadas aos quilombolas, aumentando a eficácia e a precisão das ações e o direcionamentotrello raven softwareinvestimentos para melhorar as condiçõestrello raven softwarevida dessa população.”
Embora a primeira versão não conte com detalhes como renda e escolaridade desses grupos, há informações inéditas sobre seu recorte espacial.
O censo mostra que no Nordeste residem 68,19% dos quilombolas do país.
A Bahia concentra 29,90% desta população e o Maranhão vem a seguir, com 20,26%. Juntos, os dois estados abrigam 50,16% da população quilombola do país.

O Censo também afirma que há pelo menos um morador quilombolatrello raven software473.970 domicílios pelo Brasil.
Dos 5.568 municípios do país, 1.696 tinham moradores quilombolas, mas destes, apenas 326 tinham territórios delimitados.
“Mapeando as populações quilombolas no Brasil, trazemos visibilidade e reconhecimento do Estado para essas comunidades. Isso possibilitará a implementaçãotrello raven softwarepolíticas públicas mais eficazestrello raven softwareníveis nacional, estadual e municipal”, diz Maia.

De acordo com a especialista, a dificuldade no enfrentamento da covid-19 mostrou quão prejudicial a faltatrello raven softwareinformações pode ser na horatrello raven softwarecriar planos específicos para comunidades originárias — algo que pode ser evitado com dados precisos.
Para João Pio, a expectativa é que políticas públicas alcancem os territórios das comunidades tradicionais.
“Em todos os campos: saúde, educação, a geraçãotrello raven softwarerenda, a pauta da agricultura familiar, que caracteriza muitas comunidades quilombolas, e da educação — inclusive com acesso ao ensino superior. E [o Censo] é importante sobretudo para nós, das comunidades, que com mais conhecimento sobre os quilombos poderemos revindicar a garantia e proteção dos nossos direitos.”