Há 35 anos, um desempregado sequestrou um avião — seu plano era atingir o Palácio do Planalto e matar o presidente:jogo stake

Ex-presidente José Sarneyjogo stakefotojogo stakepreto e branco

Crédito, Getty

Legenda da foto, José Sarney prestando juramento durante a doença do então presidente eleito Tancredo Neves,jogo stake15jogo stakemarçojogo stake1985

Emjogo stakemochila, Conceição portava 90 balas para recarregar a arma.

Para o tratorista, a culpa pela situação econômica que havia feito com que ele perdesse seu emprego era do presidente, José Sarney. De acordo com dados do Dieese-Sead, naquele ano o desemprego no Brasil oscilou entre 9% e 11%. A inflação era galopante:jogo stakemédia, 17,7% ao mês.

Conceição trabalhavajogo stakeempreiteirasjogo stakeconstrução civil. Comprou a arma e embarcou no último trecho do voo, que decolou às 10h52 no Aeroportojogo stakeConfins, regiãojogo stakeBelo Horizonte

Tiros e morte

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Vinte minutos depois, já no espaço aéreo do Rio, começoujogo stakeação. Deixando claro que se tratavajogo stakeum sequestro, ele disse que queria entrar na cabinejogo stakecomando e baleou um comissário que tentou impedi-lo. Conceição disparou vários tiros contra a porta da cabine — um deles atingiu outro comissário, outro acertou o painel do avião.

Com receiojogo stakeque a situação se tornasse ainda mais descontrolada, a tripulação decidiu ceder a ele acesso à cabine. Sem que o sequestrador notasse, o piloto, Fernando Murilojogo stakeLima e Silva (1944-2020) conseguiu passar ao Centro Integradojogo stakeDefesa Aérea e Controlejogo stakeTráfego Aéreo (Cindacta) o código correspondente à “interferência ilícita” ocorrendo a bordo.

Quando o copiloto, Salvador Evangelista, tentava se comunicarjogo stakevolta com o Cindacta pelo rádio, Conceição o baleou na nuca, matando-o na hora. Com a arma apontando para o piloto Lima e Silva, o sequestrador então determinou seu plano: que o avião retornasse para Brasília.

O comandante foi hábil e conseguiu dissuadi-lo da ideiajogo stakechocar o Boeing contra o Palácio do Planalto. Argumentou que não havia condiçõesjogo stakevisibilidade para isso. Mas Conceição não topou que o avião pousasse no aeroportojogo stakeBrasília — queria que fossejogo stakeSão Paulo.

Não havia combustível para tanto. Depoisjogo stakemanobras ousadas — para desequilibrar o sequestrador — e com um dos motores falhando, Lima e Silva conseguiu pousar no Aeroporto Internacional Santa Genoveva,jogo stakeGoiânia, às 13h45.

Foram horasjogo stakenegociaçãojogo staketerra. Às 19h, Conceição desceu da aeronave usando o piloto como escudo humano. Foi alvejado com dois tiros na altura dos rins por agentesjogo stakeelite da Polícia Federal. Uma terceira bala também atingiu o piloto, na perna.

Encaminhado a um hospital, o sequestrador passou por uma cirurgiajogo stakeemergência e foi anunciado que não corria riscojogo stakevida. Dias depois, contudo, morreu no hospital — o laudo apontou quejogo stakedecorrênciajogo stakeanemia falciforme, sem relação com o fatojogo stakeele ter sido baleado.

Protocolosjogo stakesegurança

Cenajogo stakegravação do filme ‘O Sequestro do Voo 375’

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, Cenajogo stakegravação do filme ‘O Sequestro do Voo 375’, que abordará o episódio

O caso se tornou um marco histórico da aviação brasileira. “Difícil dizer se houve erros quando há alguém mal-intencionado e uma circunstância inédita acontece”, comenta à BBC News Brasil a professora Larissa Ferrer Branco, arquiteta que estuda operações aeroportuárias e coordena cursosjogo stakeengenharia na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

“Em todas as indústrias e setores aprendemos sempre com casos novos, cenários improváveis ou até mesmo impensáveis. A segurança na aviação é altíssima há muitas décadas e os indicadores só melhoram”, acrescenta ela, lembrando que “é injusto julgar fatos do passado com o conhecimento que temos hoje”.

“Mas a rigor, pode-se dizer que os fatores que contribuíram para o caso dificilmente voltariam a se repetir hojejogo stakedia, com a invasão da cabinejogo stakecomandojogo stakeuma aeronave comercial por um passageiro armado”, frisa Branco.

“É praticamente impossível pensar que o aparatojogo stakesegurança aeroportuária atual seria permeável a pontojogo stakealguém entrar armado a bordo sem conhecimento do comandante da aeronave, sem seguir rígidos protocolosjogo stakeverificação. Além do mais, desde depois dos ataquesjogo stake11jogo stakesetembro [de 2021, nos Estados Unidos], as portas das cabines permanecem fechadas praticamente todo o tempo, só são abertas mediante protocolos muito rigorosos e são blindadas.”

Investigadorjogo stakeacidentes aeronáuticos e gestorjogo stakecrises, Mauricio Pontes, CEO da C5i Crisis Consulting, explica à reportagem que um sequestro como este não aconteceria nos diasjogo stakehoje por conta dos protocolosjogo stakesegurança implementadosjogo stakelá para cá.

“A começar pela revista no embarque, equipamentos, regras para transportejogo stakearma a bordo e treinamentos específicos”, enumera ele, lembrando que isso tudo “poderia ter feito diferença”. “Mas a cultura da época não contemplava esses cenários no país”, comenta.

Piloto-aluno na época, Pontes recorda que viu a cobertura televisiva do acontecimento. Ele acredita que os méritos foram do piloto para que uma tragédia não ocorresse.

“Acho que toda a atuação do comandante, com frieza, perícia e raciocínio sob pressão, foram decisivos”, diz. “A crisejogo stakesi foi um caos. O presidente [da República] sequer foi retiradojogo stakeseu gabinete, prédios não foram evacuados, enfim… Difícil falarjogo stakeerros e acertosjogo stakeum episódio com um enredo tão complexo.”

Segundo ele, pilotos na época recebiam um treinamento muito básico sobre como se comportarjogo stakecasos assim.

“Conheciam-se regras sobre como agirjogo stakecasojogo stakeinterceptação e uso do transponder para informar aos órgãosjogo stakecontrole um atojogo stakeinterferência ilícita”, cita. “Não era uma preocupação a pontojogo staketirar um tripulante por mais horas do cockpit para um treinamento específico.”

Atualmente, a questão é tratada com mais cuidado, com treinamentos periódicos que preparam pilotos e comissários para eventuais enfrentamentos, “desde casosjogo stakepassageiros indisciplinados que põemjogo stakerisco a segurança do voo até situações mais específicas e potencialmente fatais, como sequestros”.

“O comandante [do voo da Vasp no caso] foi um exemplojogo stakeprofissional e se tornou um herói. Mesmo com o primeiro oficial [o copiloto] baleado, ele foi hábil e extremamente equilibrado para conduzir o sequestrador ao longo da ocorrência, evitando um desfecho que poderia ser catastrófico”, comenta a professora Branco.

“A aeronave pouso e os passageiros e tripulantes saíram ilesos, assim como prédios públicos e pessoasjogo staketerra, que eram alvo do sequestrador. Entendo que ele [o piloto Lima e Silva] acertoujogo staketudo: a forma como conduziu uma situação extremamente incerta e grave, as manobras que fez para desestabilizar o sequestrador, a perícia e o profissionalismo, e a capacidadejogo staketrazer a aeronavejogo stakevolta ao solo com segurança”, acrescenta ela.

Pontes lembra, contudo, que as melhoriasjogo stakesegurançajogo stakevoo só foram implementadasjogo stakefato após o 11jogo stakesetembro, e não depois desse fato brasileiro.

“O assunto [do voo da Vasp] teve a repercussão típica dos grandes eventos na mídia por um curto período, mas foi rapidamente esquecido. Nada significativojogo stakefato ocorreujogo staketermosjogo stakeprocedimentos, ao que eu me lembro”, comenta. “Tanto que,jogo stakejulhojogo stake1997, um homem entrou facilmente [com um explosivo] no voo TAM 283 entre São José dos Campos e São Paulo sem ter passado pelo raio-X e a explosão a bordo matou um passageiro.”

O especialista acrescenta que tal ocasião específica deixou “a faltajogo stakesegurança dos aeroportos brasileirosjogo stakexeque e a necessidadejogo stakeinspeção por raio-X virou um tema levado mais a sério”.

“Mas só mesmo após o 11jogo stakesetembro houve uma revolução na segurança da aviação brasileira”, acrescenta. “Mais recentemente, após o evento com o Germanwings 9525, quando o copiloto jogou a aeronave propositalmente contra o solo [em marçojogo stake2015, nos Alpes franceses], protocolos mais rígidos sobre acesso à cabinejogo stakepilotos e outras medidas foram rapidamente colocadosjogo stakeprática no mundo todo, incluindo o Brasil.”

Branco concorda. “De 1988 para cá a aviação comercial mundial, e não só a brasileira, mudou bastantejogo staketermosjogo stakeprevenção a sequestros”, ressalta ela. “Instalaçõesjogo stakeum enorme aparatojogo stakesegurança para embarque dos passageiros nos aeroportos, proibiçãojogo stakeacessojogo stakepassageiros nas cabinesjogo stakecomando durante os voos, inúmeros procedimentos operacionais antes, durante e depois dos voos para impedir o acessojogo stakepessoas estranhas às operações nas áreas onde as aeronaves estacionam quando chegam e antesjogo stakepartirem são só algumas dessas mudanças.”

“Mas nenhuma delas tem correlação direta com o caso do Vasp 375. Essas mudanças ocorreram mais tarde, após 11jogo stakesetembrojogo stake2001. De 2001 para cá podemos dizer que as áreasjogo stakesegurança mudaram completamentejogo stakerelação ao que ocorria antes”, destaca a especialista.

Avião da Vasp

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Legenda da foto, Criadajogo stake1933, Vasp encerrou suas operaçõesjogo stake2005

Um filme brasileirojogo stakeação

A ideia do filme, que se chamará ‘O Sequestro do Voo 375’ veiojogo stakeconsequência a um outro “quase acidente”. No caso, envolvendo o jornalista Constâncio Viana Coutinho, quejogo stake2011, atuando como correspondente da TV Record na África, estevejogo stakeum voo que precisou fazer uma manobra arriscadajogo stakeMoçambique.

“Foi uma situação bem séria, com o avião apontando o bico para baixo. Achei que aquele momento seria o fimjogo stakeminha vida. Foi tão traumático que eu desenvolvi síndrome do pânico e desde então tenho muita dificuldade para entrarjogo stakeavião”, conta ele, à reportagem.

O fato fezjogo stakeCoutinho um obsessivo pesquisadorjogo stakeacidentes aéreos. E então, recuperando o caso da Vasp, ele passou a esboçar um roteiro para um documentário.

“Mas não foi possível fazê-lo, não consegui apoio, financiamento”, relata.

Mais tarde, contudo, seu roteiro acabou caindo nas graças do roteiristajogo stakecinema Lusa Silvestre. “E resolvemos que seria um filme”, diz Coutinho. “Ele [Silvestre] foi o primeiro cara que entrou no negócio, disse que estava dentro. Então eu passei a buscar outras pessoas para contar as lembranças do acontecimento.”

Coutinho ressalta que o filme “é uma homenagem direta ao piloto”, que teve “papel heróico” reconhecido por “todos os passageiros”. “Ele pousou praticamente sem combustível e fazendo manobras impensadas. Morreu [em 2020] com uma grande mágoa porque mesmo depoisjogo staketudo oque ele fez,jogo staketer salvado tantas vidas, o Sarney nunca reconheceu isso, nunca agradeceu.”

Com o filme prestes a ser lançado, o jornalista pretende também publicar um livro a respeito. O título provisório é ‘Nas Mãos Certas’.

Em conversa com a BBC News Brasil, o roteirista Silvestre enfatiza que o que será visto nas telas “é uma história real”. “A gente não mudou a história. O que fizemos foi lançar um pouco maisjogo stakeluz sobre algum personagem aqui e ali, contar um pouco mais, imaginar os subterrâneos do governo federal enquanto estava-se lidando com o sequestro”, comenta. “Mas a história é real, inclusive as acrobacias feitas pelo avião.”

“E incrivelmente teve um cara mesmo que sequestrou um avião para jogar no Palácio do Planalto”, resume.

CEO do Estúdio Escarlate, a produtora Joana Henning conta à reportagem que o maior desafio empreendido pela equipe foi fazer “um tipojogo stakefilme que nunca tinha sido feito no Brasil” — no caso, uma históriajogo stakeação envolvendo um avião. “As referênciasjogo stakedesenhojogo stakeprodução eram todas internacionais. Tivemosjogo stakecriar soluções alternativas com menos recursos, conseguindo dar qualidade para a cenajogo stakeação que o filme merecia”, destaca, revelando que para isso foram empregadas técnicas circenses e recursos das indústrias do carnaval e da publicidade.

O diretor do filme, Marcus Baldini lembra que “esse é o 11jogo stakesetembro brasileiro, o quase 11jogo stakesetembro brasileiro”.

“E é muito surpreendente que ninguém conheça essa história”, diz ele, à BBC News Brasil. “O filme é um jeitojogo stakecontar para as pessoas uma história muito importante que estava esquecida, sobre um herói brasileiro que salvou a vidajogo stake110 pessoas com suas habilidades e capacidadejogo stakemanter o controle. E isso foi importante para que essa história tivesse um final minimamente feliz.”

O especialista Pontes reconhece que se tratajogo stakeuma história por muito tempo relegada ao esquecimento. “O sequestro do Vasp 375 foi sumariamente apagado da memória nacional. Não teve a repercussão internacional que merecia, tampouco”, diz.